História - O melhor do bairro de Centro, Duque de Caxias, RJ

Quadro do Artista Plástico CLÊNIO / Acervo: Gênesis

ROGÉRIO TORRES
Pesquisador e membro do IPAHB

Duque de Caxias


A Baixada Fluminense é uma planície que se estende paralelamente à costa, entre a Serra do Mar e o oceano. Seus limites fixam-se entre Itaguaí (RJ) e a divisa com o Espírito Santo. Entretanto, é comum designar-se Baixada Fluminense, apenas a porção da Baixada da Guanabara, na qual estão localizados os Municípios de Nova Iguaçu, Duque de Caxias, Nilópolis e São João de Meriti.

Situada na Baixada Fluminense, Duque de Caxias abriga quase um milhão de habitantes em seus 442 km2.

Os limites da Cidade estendem-se aos Municípios de Miguel Pereira, Petrópolis, Magé, Rio de Janeiro, São João de Meriti e Nova Iguaçu. A hidrografia pode ser resumida em quatro bacias principais: Iguaçu, Meriti, Sarapuí e Estrela. O clima é quente e úmido, com chuvas abundantes na baixada litorânea, modificando-se ao norte do Município, próximo da Serra do Mar, onde encontramos temperaturas mais amenas.

O parque industrial de Duque de Caxias é significativo, superando as atividades agropecuárias, coisa pouco comum na maioria dos Municípios do Estado do Rio de Janeiro. Para se ter uma idéia, basta lembrar que, entre 1960 e 1970, a participação do Município de Duque de Caxias, no valor da transformação industrial da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, aumentou de 4,4% para 10,8%.

O centro urbano poderia ser comparado a um grande mercado, tal o volume de seu comércio. As ruas sempre congestionadas, refletem a grandeza e a importância que o comércio adquiriu. Mesmo aos domingos, o comércio não pára, pois, próximo à Praça Roberto Silveira, realiza-se uma grande feira-livre que, outrora, muito lembrava as feiras do Nordeste.

A agropecuária é de pouca expressão econômica. A maioria dos estabelecimentos agrícolas estão localizados no 3º e 4º Distritos. A mandioca, a cana e a banana são os principais produtos cultivados.

O povoamento da região data do século XVI, quando são doadas sesmarias da Capitania do Rio de Janeiro. Um dos agraciados foi Cristóvão Monteiro que recebeu terras às margens do Iguaçu, parte das quais, daria origem a Duque de Caxias.

A atividade econômica que ensejou a ocupação do local foi a de cultivo da cana-de-açúcar. O milho, o feijão e o arroz tornaram-se, também, importantes produtos auxiliares durante esse período.

O ciclo da mineração, com o deslocamento do eixo econômico do Nordeste para o centro-sul, daria à região uma de suas funções mais expressivas, a de ponto obrigatório de passagem daqueles que se dirigiam para a região das minas ou de lá regressavam.

Sendo os "caminhos de terra firme" poucos, precários e perigosos, nada mais natural que o transporte fosse feito através dos rios, onde estes existissem. Aqui, os rios não faltavam e, integrados com a Baía da Guanabara, faziam do local um ponto de união entre esta e os caminhos que subiam a serra em direção ao interior. O Porto da Estrela foi o marco mais importante desse período de nossa história. À sua volta, cresceu um arraial que no século XIX foi transformado em Município.

Apesar da decadência da mineração, a região manteve-se ainda "como ponto de descanso e abastecimento de tropeiros, como local de transbordo e trânsito de mercadorias". Até o século XIX, o progresso local foi notável. Entretanto, a impiedosa devastação das matas trouxe, como resultado, a obstrução dos rios e consequente transbordamento, o que favoreceu a formação de pântanos. Das águas paradas e poluídas surgem mosquitos transmissores de terríveis febres.

Muitos fogem do local que, praticamente fica inabitável. As terras salubres e férteis outrora, cobrem-se agora, de vegetação própria dos mangues. Em 1850, a situação é de verdadeira calamidade, pois, as epidemias grassam, brigando senhores de engenho a fugir para locais mais seguros. As propriedades vão sendo abandonadas. A situação era de grande penúria; e assim permaneceria ainda por algumas décadas.

O "coléra morbus", que já atingira outros portos do país, agora também manifestava-se em Estrela. Estava completo o quadro de destruição daquele Município que começara a entrar em agonia com a inauguração de nossa primeira estrada de ferro, em 1854.

Essa era a situação da Baixada Fluminense no meado do século XIX.

A abolição da escravatura foi outro profundo golpe no progresso da região. Agora, a Baixada Fluminense via-se privada de braços para as tarefas agrícolas e de infra-estrutura que mantinham a salubridade local.

Nessa altura, Meriti representava apenas um porto de escoamento de poucos produtos, dentre os quais a lenha e o carvão vegetal. A recuperação de Meriti começa a insinuar-se com o advento da estrada de ferro, a mesma estrada de ferro que levara tantas localidades ao acaso - Estrela, Vila de Iguaçu, Porto das Caixas. Sob a égide da maria-fumaça, de silvo estridente e penacho de fumo negro, tudo se modificou. As hidrovias com seus barcos, portos e vilas, estavam com seus dias contados. Agora, a ferrovia, obedecendo à lógica do progresso, ditava novos traçados nos caminhos, fazendo surgir à volta de suas estações, povoados que se transformariam em populosas cidades. Quando a ferrovia atinge o vale de Meriti, a região começa a sofrer os efeitos da expansão urbana da Cidade do Rio de Janeiro. Com a inauguração da "The Rio de Janeiro Northern Railway", em 23 de Abril de 1886, ficamos definitivamente ligados ao antigo Distrito Federal. Era o progresso que novamente avizinhava. Entretanto, apesar dessa "insinuada recuperação" que a ferrovia trouxera, a Baixada continuava sofrendo com a falta de saneamento, fator de estancamento de seu progresso.

Durante os primeiros anos da República, foram tomadas algumas medidas para solucionar o problema do saneamento, entretanto, elas não chegaram a produzir os efeitos esperados, devido à descontinuidade dos programas e à precariedade de recursos materiais. Foi no Governo de Nilo Peçanha que esboçou-se uma ação mais consistente relação ao saneamento da Baixada.

O Serviço de Profilaxia Rural, criado no Governo Delfim Moreira (1918/1919), foi mais um passo para o controle das endemias na região. Mas, apesar de todos esses esforços, o local continuava sendo um grave foco de malária. Foi no Governo de Getúlio Vargas que medidas efetivas foram tomadas para a solução do problema. O programa de abertura de canais, dragagem e retificação dos grandes rios, realizado por Hildebrando de Góis, fez com que os pântanos desaparecessem. Era o problema sendo acabado em suas causas.

Finalmente, o Serviço Nacional de Malária, instalado em 1938, faria retroceder essa perigosa endemia, abrindo caminho para o total saneamento de "Caxias", na época, 8º Distrito de Iguaçu.

Lembra a historiadora Dalva Lazaroni que: "Para se ter uma idéia do estrago provocado pela doença, basta verificar que, por volta de 1795, nossa população chegou a ser estimada em número superior a 17.022 habitantes. Nos anos seguintes, de comprovada prosperidade, crescemos muito mais. Pois bem já no fim do século XIX, estávamos reduzidos a menos de 400 moradores."

Fiel ao "slogan": "Governar é abrir estradas", Washington Luís inaugura em 28 de Agosto de 1928, a Estrada Rio-Petrópolis que, atravessando a cidade, seria um importantíssimo fator de desenvolvimento da mesma.

Mais dois acontecimentos, também de grande significação para o Município, aconteceram nessa década: a instalação de nossa primeira rede elétrica, em 1924 e a fundação da Escola Proletária Meriti, primeira no Brasil a aplicar os métodos da "Escola Nova". A Escola Proletária Meriti, obedecendo aos métodos montessorianos, mereceu elogios dos mais eminentes educadores e intelectuais do país.

Tais eventos só poderiam favorecer à região, proporcionando um intenso povoamento a partir daí. As terras da Baixada serviam, agora, para aliviar as pressões demográficas da Cidade do Rio de Janeiro, já prenunciadas no "Bota Abaixo" do Prefeito Pereira Passos. Os dados estatísticos revelam que em 1910, a população era de 800 pessoas, passando em 1920, para 2920.

O rápido crescimento populacional provocou o fracionamento e loteamento das antigas propriedades rurais, naquele momento, improdutivas.

O primeiro loteamento legalizado de que se tem notícia é o Parque Artur Goulart, aprovado em 1914, junto à estação de Duque de Caxias.

Mas nem sempre a aquisição de terras foi pacífica e legal. A luta entre proprietários, grileiros e posseiros, algumas vezes assumiu contornos dramáticos, inclusive com mortes.

O grande desenvolvimento pelo qual passava Meriti levou o Deputado Federal Dr. Manoel Reis a propor a criação do Distrito de Caxias. Dessa forma, através do Decreto Estadual 2559 de 14 de março de 1931, o Interventor Federal Plínio Casado elevou o local a 8º Distrito de Iguaçu.

Fato também digno de nota, acontecido na década de 30, foi a fundação da União Popular Caxiense (UPC). A UPC foi a mais importante das associações de Duque de Caxias, pois serviu de célula mater das demais entidades surgidas em nosso Município. Em sua fundação, teve importante papel o jornalista Paulino Batista da Silva que, inclusive, franqueou sua residência para a primeira reunião, isso em 1933. Embora o nome possa dar idéia de que era uma organização surgida da comunidade, tal não se dera. A UPC foi consequência natural do surgimento da consciência da emergente elite local, diante de seus problemas. Tanto assim que, a Associação Comercial de Caxias seria fundada dentro da UPC, em 1937.

Também dessa década é a inauguração da primeira empresa de ônibus. Fazia ele as linhas Caxias - Penha e Centro - Parque Lafayete (1932). A fundação do Belém Futebol Clube (1935), do jornal "A Voz do Povo de Caxias" (1934), da Igreja Santo Antônio (1939), são marcos importantes de uma década das mais profícuas para o Município. Tudo leva a crer que o "espírito" que animara a Revolução de 30, agora manifestava-se - guardadas as devidas proporções - no Distrito de Caxias.

Os anos 40 encontrar o Distrito com uma população que já atingia a casa dos 100.000 habitantes. Nessa altura, já apresentávamos a característica de "dormitório", pois, a população concentrava no Distrito Federal, sua atividade profissional.

Prenunciando a grande industrialização que surgiria alguns anos mais tarde, tem início, em 1940 a construção da Fábrica Nacional de Motores. Inicialmente projetada para produzir motores de aviões, seria, mais tarde, transformada em Sociedade Anônima, passando a fabricar um caminhão pesado, e que por suas características de robustez e economia, ficaria famoso. O "feneme", até a década de 60, rodou quase sem concorrentes pelas estradas acidentadas da época. Apesar de feio e lento, o caminhão gozou de merecido prestígio junto aos brasileiros. Em 1968, a União transfere a Fábrica Nacional de Motores para a iniciativa privada.

Embora progredindo velozmente, e com uma população que já ultrapassava a casa dos 100.000 habitantes, "Caxias" não dispunha da maioria dos serviços que o Poder Público deve prestar. O Governo Municipal instalado em Nova Iguaçu, mostrava-se impotente para satisfazer às menores necessidades do Distrito. A presença do Governo Municipal era notada apenas através da coleta dos impostos. Dessa forma, a emancipação política ia, aos poucos, seduzindo a elite local. Em 25 de julho de 1940, uma comissão formada por Silvio Goulart, Rufino Gomes Júnior, Joaquim Batista Linhares, José Basílio da Silva, Luiz Antônio Félix, Amadeu Lanzelotte, Antônio Moreira de Carvalho, Mário Pina Cabral, Abílio Teixeira de Aguiar, Ramiro Gonçalves e Costa Maia, encaminha ao Interventor Federal do Estado do Rio de Janeiro, Ernani do Amaral Peixoto, um memorial, expondo as possibilidades do Distrito de Caxias emancipar-se de Nova Iguaçu. O documento foi considerado impertinente e inoportuno, sendo seus autores, punidos. Ficara adiado o sonho da emancipação. Entretanto, três anos depois, isto é, em 31/12/1943, através do Decreto nº 1056, foi criado o Município de Duque de Caxias. Em consequência desse ato do Interventor Federal, é nomeado o contabilista Homero Lara para responder pelo expediente da Prefeitura. Ainda nesse dia, é criada a Comarca, sendo o Dr. Miguel Pinaud seu primeiro juiz.

Até 1947, os Prefeitos de Duque de caxias foram nomeados pelo Interventor Federal. Gastão Glicério de Gouveia Reis, foi o primeiro Prefeito eleito por voto popular, tendo seu governo início em 28/09/1947 e término 28/12/1950. A Câmara foi instalada em 23/10/1947 e os primeiros Vereadores também foram eleitos no mesmo processo eleitoral em que saiu vitorioso Gastão Reis.

>No alvorecer dos anos 60, a Cidade já possui um ativo comércio e um parque industrial que, com a instalação da Refinaria Duque de Caxias (REDUC), se tornaria num dos mais importantes do país.

Mas, apesar de tudo isso, sofríamos, ainda, com agudos e crônicos problemas: o abastecimento de água era um deles. O problema aumentava na medida em que também aumentava a população e, àquela altura, a população atingira a casa dos 243.619 habitantes. No Governo Roberto Silveira (1959/1961), foram instalados equipamentos que permitiram canalizar água para quase todo o Município. Ficou célebre a frase do então Governador: "Duque de Caxias não passará outro 25 de agosto sem água". Dito e feito. A água que servira de trampolim para a eleição de tantos políticos oportunistas, agora jorrava das torneiras, encerrando a carreira de muitos deles.

Na década de 70, Duque de Caxias tornou-se "Área de Segurança Nacional", só recuperando sua autonomia, efetivamente, com as eleições de 15/11/1985. Nelas, sai vitorioso, Juberlan Barros de Oliveira que governaria de 01/01/1986 a 31/12/1988.

A Cidade cresceu muito, em nada lembrando a velha estaçãozinha ferroviária, cercada de meia dúzia de casebres. Suas ruas sempre congestionadas, revelam a desordem de um progresso que nada poupa. Nesta Cidade, as transformações são rápidas. A cada momento derruba-se, aqui e ali, uma vetusta residência que dará lugar a um novo edifício de apartamentos, talvez uma lanchonete ou (quem sabe?) uma outra agência bancária.

Da velha Meriti só restou "um retrato na parede".
 

ROGÉRIO TORRES
Pesquisador e membro do IPAHB