História - O melhor do bairro de Perus, São Paulo, SP



HISTÓRIA DE PERUS

A busca de ouro foi tema recorrente durante os primeiros estágios da ocupação portuguesa do Brasil, fato explicável pela conquista espanhola dos Impérios Asteca e Inca, e de suas enormes reservas de prata, logo no começo do século XVI.

Assim, de acordo com Alfredo Ellis Junior, não é surpreendente que, mal chegado à costa brasileira em 1530, Martim Afonso de Souza tenha tratado de enviar um destacamento ao interior do território em busca de metais preciosos. Outras explorações se seguiram, propiciando notícias de descobertas em Apiaí (alto Vale do Ribeira), Paranaguá e outros pontos do sul da colônia entre 1561 e 1592. O ouro levado da Vila de Santos por corsários ingleses em 1588 e 1591 é uma segura confirmação do sucesso desses empreendimentos. Porém, de maior monta foi o ouro encontrado em 1590 no Pico do Jaraguá e no Córrego Santa Fé - cujas nascentes situam-se na encosta da montanha - pelos Affonso Sardinha (pai e filho com o mesmo nome) e por Antonio Bicudo Carneiro. (Ellis Junior, 1942, p. 111-2, op. cit.)

O impacto do mito que se criaria acerca do ouro de Jaraguá foi tamanho que, em 1839, (reproduzindo uma opinião ainda muito em voga nos dias de hoje) o reverendo metodista Daniel Parish Kidder anotava que as velhas minas de ouro do Jaraguá... foram as primeiras descobertas no Brasil. Produziram muito durante a primeira metade do século dezessete, e as grandes quantidades de ouro de lá canalizadas para a Europa granjearam para a região o cognome de segundo Peru; tiveram, além disso, o mérito de incentivar a exploração do interior da qual resultou a localização de diversas zonas auríferas em Minas Gerais (Kidder, 1980, p. 194, op. cit., grifos nossos).

"Segundo Peru", "Peru do Brasil" (Santos & Rodrigues,1998, p. 49), denominações cuja popularidade rivalizava com o topônimo oficial da região no Período Colonial: "Ajuá" (nome de um arbusto espinhento).

O ilustre historiador Affonso d"Escragnolle de Taunay constatou, em documento de época, que o empreendimento minerador dos dois Sardinha começou precisamente em 1597, em sociedade com o Sr. Clemente Alves. Taunay identifica uma autêntica "miragem americana", consubstanciada, por exemplo, pela espetacular vinda a São Paulo de uma comissão governamental de alto nível, acompanhada de técnicos, para estudar in loco as jazidas do Jaraguá. (Taunay, 1921, p. 197-9, 239 e seguintes).

Todavia, como bem questiona Ellis Junior, quanto ouro teria sido proveniente da mineração quinhentista? O dado que o professor encontrou, na História Econômica do Brasil de Roberto Simonsen, é de 930 arrobas, em relação ao qual ele, Ellis Junior, expressa opinião de que não deveria estar muito longe da exatidão, pois incluía também as outras fontes de metal precioso do sul da Capitania, em todo o Período Colonial.

Para evidenciar-se a insignificância desse montante, basta lembrar que, no século XVIII, a quantidade mínima de ouro que deveria ser arrecadada anualmente pelo sistema de coleta de impostos em Minas Gerais era de 100 arroubas (cerca de 1.500 quilos). Portanto, a mineração do Jaraguá não deveria ter sido uma abundante cornucópia de riquezas. Fosse, teria sido um fanal [o mesmo que farol, obs. minha E. S.] atrator de grandes massas demográficas que teriam feito de S. Paulo e do planalto paulista uma região super povoada de elementos reinóis, tal como foram as Minas de Ouro no setecentismo ... Entretanto, o fato da mineração paulistânica, no Jaraguá e proximidades, não teve grande repercussão na evolução histórica de S. Paulo. Sua população não teve surtos de progresso em virtude dessa mineração. Sua economia não ofereceu manifestações de euforia em matéria de conforto, as quais seriam visíveis se tivessem havido. Enfim, tudo nos denuncia que ... [a] mineração planaltina ... foi apenas um leve arranhão na vida econômica paulistana. (Ellis Junior, 1942, p. 112-3, op. cit.)

Deve-se observar que os dados de Ellis Junior são compatíveis com o relato de Kidder que disse ter encontrado a lavra abandonada aos pés da montanha, num terreno de aluvião, sem se propor a realizar uma investigação rigorosa que confirmasse tudo o que ouvia. Seu depoimento é um bom indício, conseqüentemente, da permanência da "miragem americana" (Taunay) no imaginário dos moradores da Vila de Piratininga.

Bairro mais setentrional de São Paulo (a despeito de dificilmente ser visto como integrante da Zona Norte da Capital), situado na região do Vale do Rio Juquery e da Serra Cantareira, Perus é um núcleo urbano isolado do restante da cidade por um cinturão verde cada vez mais tênue, características que fazem com que muitas pessoas tomem-no por um dos Municípios do Norte/Noroeste da Grande São Paulo, confusão explicável pelas fortes ligações históricas e culturais entre Perus e as cidades vizinhas.

A região do Vale do Rio Juquery e da Serra da Cantareira foi zona de passagem de tropas militares e importante entreposto de abastecimento durante o período colonial e sob a vigência do Império, fato que ficaria materializado em vias que fazem a ligação entre Perus e os bairros de Parada de Taipas e Jaraguá: Av. Raimundo Pereira de Magalhães, ou Estrada Velha de Campinas, e Estrada São Paulo-Jundiaí.

De longa data, há registros históricos sobre Perus. No século XVII, existiram em sua área a Fazenda dos Pires, propriedade de Salvador Pires Medeiros, capitão da gente de São Paulo, dedicada à produção vinícola; e a Fazenda Ajuá, pertencente ao paulista Domingos Dias da Silva, tida como uma das maiores fazendas de cereais nas cercanias da Capital no começo do século seguinte. Em l856, o Registro Paroquial de Nossa Senhora do Ó assinalava dezessete proprietários de terras no "Bairro do Ajuá", antigo nome de Perus. Em 1867, os grandes proprietários eram Antonio Francisco de Aguiar e Castro, Candido da Cunha Brito, o Coronel Luiz Alves de Almeida, Hedwiges Dias de Oliveira (antigo nome da R. Crispim do Amaral) e Jesuino Afonso de Camargo, nome de outra rua em Perus.

Nesse mesmo ano (1867), junto com o restante da São Paulo Railway (atual E. F. Santos-Jundiaí), foi inaugurada a Estação de Perus, dando início a um processo de urbanização do Vale cujos grandes marcos foram a Companhia Melhoramentos de São Paulo (1890), o Hospital Psiquiátrico do Juquery e sua Fazenda (1898), a Estrada de Ferro Perus-Pirapora (EFPP, 1910) e a Companhia Brasileira de Cimento Portland (1926). Também digna de menção é a Fábrica de Pólvora erguida a uns duzentos metros da Estação de Perus, da qual restam alicerces. Nos primeiros anos da República, junto com a Ipanema, esta Fábrica foi a principal fornecedora de munição para o sistema de defesa do Porto de Santos.

Como resultado dessas iniciativas, seriam criados os núcleos fundamentais de Perus e de suas cidades-irmãs: Caieiras, Franco da Rocha, Francisco Morato e Cajamar.

De imediato (ou melhor: antes da inauguração da Fábrica de Cimento), o acesso ferroviário trouxe a vinda de novos proprietários para Perus, como Antonio Maia, Di Sandro, Achiles Fanton, Ernesto Bottoni, Narciso Cagnassi, Leonardo Correia, Julio de Oliveira, Vasco Gazzo, Demetrio Vidal Lopes, Pascoale Peciccacco, Peregrino Lage, Sylvio de Campos, Joaquim Serpal; nomes que, em sua maioria, estão estampados nas placas de ruas e avenidas do bairro. Homenagem mais do que justa pois os loteamentos foram formados a partir de glebas pertencentes a famílias desses senhores. Quanto aos porquês da presença desses nomes das placas, o fato é que a memória do papel dos personagens popularmente reconhecidos como os "pioneiros" da localidade está se perdendo nas penumbras do tempo. Salvo reminiscências repassadas oralmente, quase de forma mítica, pouco se sabe do passado agrícola recente de Perus, do modo de vida e das dificuldades enfrentadas num período não tão distante.